Início Educação APEDE | Manifesto em defesa da Escola Pública, do Ensino e dos...

APEDE | Manifesto em defesa da Escola Pública, do Ensino e dos seus Profissionais.

12
0

Após duas décadas de erosão contínua, orquestrada e intencional, da autoridade e do estatuto socioprofissional dos professores, assente na degradação das carreiras e salários, precariedade laboral e falta de respeito pelos vínculos familiares e afetivos, desautorização pedagógica, indisciplina crescente, burocracia infernal, modelo de avaliação injusto e opaco, gestão escolar unipessoal e autocrática, crescente facilitismo e pressão para o sucesso administrativo, sobrecarga horária, múltiplas tarefas e funções burocráticas, enfim, um ataque ao prestígio e à dignidade profissional docente, que levou muitos milhares a abandonar o ensino, deixando muitos dos que ficaram no sistema em situações intoleráveis de exaustão, “burnout” e desânimo, parece-nos imperioso, urgente e necessário, uma clara e decidida inversão no rumo das políticas educativas que mergulharam a Escola Pública na sua maior crise de sempre em democracia. A Escola Pública só poderá retomar o papel de elevador social que tem de ter, integrando todos os alunos, sendo instrumento de justiça e valorização social, rasgando horizontes e desarmando desigualdades com vista a um Portugal melhor e com futuro, se os governantes entenderem, verdadeiramente, os desafios que estão colocados e os caminhos que devem ser percorridos. Desde logo, é fundamental que exista vontade política e políticos com estatura e visão prospetiva que assumam como prioridade a valorização da Escola Pública e de todos os seus profissionais, a pacificação e a melhoria do clima escolar, o apetrechamento das escolas com os meios e recursos humanos e materiais necessários, a remoção dos obstáculos que dificultam um ensino de qualidade, feito de conhecimento, criatividade e sentido crítico. Só assim a Escola Pública poderá cumprir o seu importante e insubstituível papel social. A aposta na Educação tem de ser feita de uma forma sustentada e prolongada no tempo, assente num pacto de regime (que não pode ser fundado em tacticismos políticos conjunturais ou oportunismos demagógicos de puro eleitoralismo), acompanhado dos recursos financeiros necessários que permitam investir a sério no tanto que está por fazer. Idealmente, gostaríamos de ter na pasta da Educação um Ministro ou, no mínimo, um Secretário de Estado, com conhecimento e experiência real, direta e vivida de lecionação nas salas de aula do ensino básico e secundário, especialmente nas últimas duas décadas, para que pudesse verdadeiramente entender os problemas e necessidades da Escola e dos seus profissionais, docentes e não docentes. Se assim fosse, teríamos a certeza de que iria concordar connosco quando referimos que para termos uma Escola Pública melhor seria necessário conseguir:

1. A valorização e atratividade da carreira, com a devolução integral do tempo de serviço congelado (incluindo um mecanismo de compensação para os professores já aposentados, ou que estejam nos últimos escalões da carreira e já não possam recuperar todo o tempo a devolver), o reposicionamento de todos os docentes de acordo com o seu tempo de serviço, (resolvendo-se assim as injustiças ocorridas com as ultrapassagens) e a atualização dos índices remuneratórios (corrigindo a significativa perda de poder de compra ao longo dos últimos 15 anos), devolvendo-se justiça e esperança e criando condições para que possam regressar ao sistema milhares de professores que optaram por outros percursos profissionais, motivar os que ainda se mantêm no ensino e, finalmente, atrair os mais jovens à profissão, combatendo-se o dramático problema da falta de professores;

2. A promoção da Escola como um espaço privilegiado de conhecimento e de desenvolvimento de valores, criatividade e  sentido crítico, assente no rigor, respeito e responsabilidade, assegurando uma verdadeira igualdade de oportunidades, e garantindo as respostas educativas mais adequadas a cada aluno, para o que será fundamental a contratação dos recursos humanos necessários- psicólogos, terapeutas, assistentes sociais, professores de apoio/substituição, etc.;

3. A democratização da gestão escolar, alterando o atual modelo unipessoal e autocrático para um modelo colegial, de equipa diretiva eleita em conjunto, de forma universal e com limitação de mandatos;

4. A reversão dos mega-agrupamentos, devolvendo identidade às escolas, sentido de pertença, uma gestão democrática de proximidade e a melhoria do clima escolar;

5. O melhoramento e requalificação dos espaços escolares: climatização, atualização e manutenção dos recursos tecnológicos (incluindo internet fiável), auditórios, espaços de convívio abrigados para os alunos, salas de trabalho para os departamentos/grupos disciplinares e para receber Encarregados de Educação, conservação dos edifícios, mobiliário e equipamentos, etc.;

6. A criação de um maior número de vagas de quadro (deixando de as mascarar como meras necessidades transitórias) de forma a estabilizar mais docentes e permitir uma aproximação à residência, o que pode também ser conseguido com a recuperação da “lei dos cônjuges”;

7. A garantia da colocação de professores em respeito exclusivo pela lista nacional graduada, sem qualquer cedência, como seria a possibilidade da contratação direta de docentes pelas escolas e/ou municípios;

8. A atribuição de ajudas de custo e subsídios de alojamento adequados e eficazes, que resolvam de vez os graves problemas de habitação dos professores deslocados;

9. O fim das quotas no acesso ao 5.º e 7.º escalão e um modelo de ADD justo, motivador e transparente, com divulgação pública das classificações;

10. O respeito pela autonomia científica, pedagógica e didática dos docentes, recusando o “totalitarismo” pedagógico em voga, com a imposição de metodologias de ensino,  teorias, modelos e práticas, importadas de outros contextos e realidades, muitas vezes sem sucesso comprovado, ao sabor de modismos e “impressões digitais” governativas, prescritas numa política “top to down”, excludente de outras abordagens pedagógico-didáticas e experiências educativas;

11. Uma maior e melhor articulação com as instituições de Ensino Superior, assegurando uma formação  inicial exigente e de qualidade que prestigie a profissão, e também uma formação contínua que garanta a permanente atualização científica e pedagógica dos docentes, sendo aqui de sublinhar a importância dos Centros de Formação, que deverão ter mais autonomia e recursos financeiros para o desenvolvimento dos seus planos de formação;

12. A redução das horas da componente não letiva, pois a CNL tem sido, ao longo dos anos, um dos maiores fatores de exaustão e desgaste profissional, não só esvaziando por completo a redução do tempo de serviço letivo (ao abrigo do artigo n.º 79), mas também amarrando os professores às escolas em tarefas muitas vezes não adequadas ao seu perfil e sem ganhos significativos de produtividade na dinâmica escolar. Desse modo, seriam criadas condições para estimular a autoformação docente (com a frequência de seminários e colóquios, etc.). Paralelamente à redução das horas da CNL, seria fundamental assegurar a possibilidade de uma efetiva formação e atualização científico-pedagógica, relativa à formação contínua, à frequência de cursos especializados ou à realização de investigação aplicada, com a fixação do contingente previsto no n.º 1 do artigo n.º 108 do ECD (licenças sabáticas), a aguardar despacho governamental há mais de uma década;

13. A revisão dos programas das diversas disciplinas, procurando-se um correta articulação horizontal e vertical e a sequencialidade dos ciclos de ensino;

14. A reconfiguração das cargas horárias das áreas curriculares, revalorizando-se as Ciências Socias e Humanas e eliminando o conceito de “disciplinas estruturantes”;

15. A redução do número de alunos por turma e a definição de um limite máximo de turmas por professor, evitando-se situações injustas de sobrecarga de trabalho entre docentes;

16. O respeito efetivo pelas reduções no âmbito da aplicação do artigo n.º 79 do ECD, que deverão voltar a ser atribuídas nos limites de idade originais e transferidas para a componente de trabalho individual do professor;

17. O reforço substancial da redução horária atribuída ao cargo de Diretor de Turma, hoje por hoje, um dos cargos de maior responsabilidade, envolvimento pessoal, desgaste e dispêndio de tempo por parte dos professores que assumem esta função;

18. A revisão da carga horária dos educadores e professores em monodocência, assegurando uma maior igualdade na componente letiva comparativamente a colegas de outros ciclos de ensino e a aplicação do artigo n.º 79 sem alíneas discriminatórias ou necessidade de  autorização prévia;

19. A possibilidade de uma aposentação antecipada, sem penalização, para quem tenha completado 36 anos de serviço e/ou 60 anos de idade, por forma a combater a exaustão, o “burnout”, e evitar as baixas médicas prolongadas (mais do que justificadas, dadas as condições em que muitos docentes exercem a sua profissão), promovendo-se também o rejuvenescimento dos quadros;

20. A alteração dos critérios e uma maior transparência do regime da mobilidade por doença (MPD), pois as doenças (com listagem/descrição por atualizar há longos anos) não obedecem a quotas/vagas, ainda para mais não publicitadas no início do processo de mobilidade, ou a distâncias mais ou menos alargadas, ofensivamente contadas em linha recta;

21. A possibilidade de integração na CGA de todos os docentes que manifestem essa intenção, em particular os que foram injustamente excluídos no passado, evitando-se assim situações totalmente inaceitáveis de discriminação;

22. A eliminação das tarefas e registos burocráticos inúteis, redundantes e de nula/questionável eficácia ou justificação, devolvendo tempo ao professor para a preparação das atividades letivas, entre outras, relacionadas com a docência;

23. O abandono da injusta comparação entre escolas públicas e privadas, através dos “rankings” de resultados em exames, pois é impossível e falacioso comparar o incomparável, desde logo, porque a Escola Pública não segrega, não exclui, não seleciona, inclui todos e é com todos que desenvolve o seu trabalho e se apresenta a exames;

24. A prevenção e o combate efetivo à indisciplina, à violência e ao bullying em meio escolar, pois o respeito e o cumprimento das regras e normas de conduta são a base do ato educativo e todos os elementos da comunidade escolar têm o direito a um ambiente de trabalho seguro e motivador, sem esquecer o pessoal não docente, tantas vezes esquecido e pouco valorizado não só no interior das escolas mas também pelos governos, nomeadamente nos salários e condições de trabalho;

25. Por fim, mas não menos importante, a criação de um clima de diálogo e respeito mútuo entre a tutela e os professores, que permita negociações sérias e resultados céleres e concretos, dando resposta às justas reivindicações docentes e eliminando práticas e posturas arrogantes, provocatórias e de falta de respeito em relação aos profissionais de educação, de que são exemplos… a suspeição constante sobre as baixas médicas (que em boa parte deixariam de existir se o Estado tivesse mantido a reforma após os 36 anos de serviço, impedindo desse modo o brutal envelhecimento da classe docente, entre outros fatores de desgaste causadores de muitas dessas baixas), a determinação de serviços mínimos “à la carte” que colocam em causa o direito à greve (reiteradamente considerados ilegais pelos tribunais), os atropelos e abusos na composição dos horários docentes,  a insensibilidade face a situações de agressão perpetradas por pais e alunos (com o silêncio dos responsáveis políticos, incapazes de assumir uma posição firme de repulsa e condenação), a recusa da mobilidade por doença, com a aplicação de critérios desumanos e injustos, e a incapacidade em resolver o problema da “casa às costas” de largos milhares de docentes ao longo de muitos anos, numa vida de precariedade, dificuldades financeiras e sonhos adiados.

São estas as 25 propostas e desafios essenciais que apresentamos em defesa da Escola Pública, pilar fundamental do nosso regime democrático e fator determinante de justiça social, de uma Educação de qualidade para todos e de um País com Futuro! Para tal, é imperioso que se respeitem e valorizem os professores!

Porque sem professores não há Educação!

E sem Educação não há progresso, nem futuro!

APEDE

DEIXE UMA RESPOSTA

Please enter your comment!
Please enter your name here

Este site utiliza o Akismet para reduzir spam. Fica a saber como são processados os dados dos comentários.